Interrogação evolucionista, circunstanciada em aturada exegese, sobre o trânsito literário em Portugal

 


É humildade ou soberba, pensar que um texto há-de valer pela sua qualidade e isso será bastante para que tenha o espaço merecido (o seu lugar exacto). Não mexer uma palha, em prol do texto, senão tê-lo feito o melhor que se pode, é sinal de timidez ou de arrogância suprema? Acreditar que tudo o que é bom vem ao de cima e tudo o que mau se afunda sem remissão e que a natureza é justa, sempre: é isso acreditar demais no mestre Darwin? Verificar, sem tentarmos correcções, que o texto não saiu sozinho de onde estava, é resignarmo-nos à sua fraqueza ou é resignarmo-nos à nossa? As obras boas sobreviveram por serem boas, ou por terem autores ferozes? Quem leva o texto aos leitores - deve fazer parte da máquina selectiva ou ser um mecanismo para interromper a selva? Já dentro do escuro, para que serve o leitor? Cova última do texto? Factor de combustão eterna? Sob que critério? A quem chega tanta carne, valerá a pena chorar pelo que não chegou, duvidar, farejando, que a caça que nos mostram não é a caça toda da montanha? Que tanta coisa morreu antes que houvesse o trabalho mínimo de a salvar? O trabalho de quem escreve, o trabalho de quem escolhe e traz e dispõe nas luras do leitor o pasto a consumir, esse trabalho é de quem? Deve o escritor ser o servo disto tudo, aquele que carrega com o texto desde o ventre até aos lugares mais fundos da memória alheia? Ou só um deus ausente, desses que se limitam a dar o pontapé de saída acendendo a chama da explosão universal. Quem salva? Quem mata?

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